sábado, 13 de março de 2010

Nada

Frase do Post: "Prefiro a dor à indiferença" (Anatole France)


Para a falta de palavras... música.
Ouçam... e isso é tudo para o momento.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Igor



Frase do Post: "Aguente firme, pois tem gente que é pra sempre na sua vida" (Ademar Soledad)

Deu a hora, a de sempre
Que nunca havia sido marcada mas existia pairando nas tardes
E ele não chegou
Mas eu sabia que não viria
Porque dias antes ele chegou como sempre chegava
Sorrateiro, desconfiado
E então
Quando percebia que não era incômodo
Sentava-se do lado de lá do meu computador
E deitávamos falação sobre um tudo

Mas no dia que foi o último
O dia de despedir
Ele chegou sorrateiro, desconfiado
Que, como eu já disse, era como ele sempre chegava
Mas chegou também com o “olhar molhado”
E, como sempre nessas ocasiões tristes
Fingiu que era um cisco no olho
E eu fingi que era um dia normal
E rezei para que não houvesse despedidas
Porque no último ano sofri muitas delas
Renata... Luiz... João... Cléo...Maísa...
E esta, eu sabia, iria me arrasar

Ai meu Deus ! É difícil continuar atravessando a vida
Quando seus amigos tem de ir embora
Tem de ir crescer
e você fica miúdo
e o que antes era uma rotina barata
Se torna uma lembrança dolorida e cara
porque está no passado
E tudo o que foi e não é mais
Mas foi bom
Dói demais

Você sabe que não vai ser a mesma coisa
Você sabe que os dias nunca mais serão os mesmos
Você sabe que ama os seus
Mas que eles tem de seguir, e você também

Quando ele saiu ainda fingindo tirar o cisco do olho
Que então já parecia grande demais para que ele suportasse
Não viu quando amaldiçoei certas propriedades dessa roda-viva da vida
Não viu quando caí num choro desembestado
Não viu quando perdi a compostura
Não soube que fui embora porque não mais conseguia
E agora?
E agora?

. . .

Run, Igor, run !
Já que não tem jeito
Vá fazer o seu cinema
O seu texto
O seu amor
A sua vida
Siga nesta sua fúria apaixonada porque os céticos são entediantes, siga questionando porque o comodismo ainda é o jeito mais burro e rápido de morrer, siga implicando porque os legais são chatos demais, siga sendo você.
Nunca mais todos os dias nossa prosa
Mas pra sempre a memória e a amizade
Meu grande e brilhante amigo

Não vou "seguir me esquecendo de você"

Te amo à morte, coração-pulsante-de-geléia !

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Folia no coração



"Ora bolas, não me amole... o que eu quero é sossego" (Tim Maia)

Tô vendo esse zumzumzum aí
E enquanto tantos se preparam para as festas de suor e samba
Vou me aquietando por aqui mesmo...
No meu canto sagrado, com meus livros, filmes e verdades
Vou é tirar essas fantasias de profissional imbatível
E botar umas roupinhas bem velhas, leves e descombinadas
Vou é silenciar
Me exilar
Lavar os cabelos, tirar o esmalte e trocar os lençóis
Não pretendo ver um único baticum
Nem purpurina
Nunca gostei disso e
na verdade
Minha folia tá é n’alma
E não tem data marcada pra acontecer
Nesses dias vou atrás é dos meus trilhos
Esta fé que brinca de se esconder de vez em quando
Vou é cuidar de fortalecê-la
Tomar uns passes, essas coisas...
Preciso escutar Nina Simone, ou Norah Jones, ou Marisa Monte
E de novo ficar em silêncio
Preparar uma nova receita de peixe
Que é pra ver se aprendo a gostar disso de vez
Deixar uma essência de pitanga arder no difusor
E invadir a casa
Apagar todas as luzes diretas, frias, fortes,
Que me cegam e me cansam
E acender minhas velas
Enquanto pelas janelas entreabertas
Entra um ventinho educado
E balança as pétalas das flores frescas que comprarei para botar no vaso
E por fim,
Vou querer um abraço de meu marido
Seu colo, suas risadas e conversas
E sobretudo seu olhar cúmplice
E, da minha filha, me bastará o direito de vê-la sendo.
E isso, além de sono, água e alimentos,
É tudo o que eu preciso
Para estar viva
E para que a folia se faça em meu coração

sábado, 30 de janeiro de 2010

O essencial



"A vida é o que acontece enquanto fazemos planos" - John Lennon

Morei a vida toda em casa. Com um quintal modesto, uma goiabeira e um pé de capim-cidreira para aqueles dias irritados. Na garagem, só cabia o carro do meu pai, muito apropriado, aliás, para sua receita. Uma televisão que quase diariamente era motivo de briga entre meus três irmãos e eu. Um banheiro para todos. A mesma comida, o suco de limão na mesa do almoço.
E, naquela época, eu sonhava em morar em apartamentos. Ah, eu achava essa coisa de apartamento muito cosmopolitana, e eu mesma sempre me achei muito cosmopolita, novidadeira, do tipo que não suporta esse papo de acampamento, trilha, banheiros desconfortáveis, luz do luar. Confesso: eu sempre olhei para a lua achando que ela é, apenas, uma ... lua? Algo redondo e branco, por vezes amarelado, nada demais. A lua sempre foi algo simples para mim como uma folha, de árvore ou de papel, não importava.
E então, já grandinha, mamãezinha, me mudei com muita satisfação para o primeiro apartamento da minha vida. Este onde hoje moro. E, diferentemente do lar onde cresci, são três banheiros, duas televisões, fora o computador e etecetera...
Oh, eu tinha o céu, e não sabia. O capim-cidreira arrancado fresquinho para um chá que minha mãe me fazia quando eu inventava medo de monstros, e isso não posso dar para minha filha, pelo menos não com aquele charme. Se for, vai ser no estilo sachê, bem casual.. Bem cosmopolita. Ninguém briga por televisão porque cada uma tá no seu canto: meu marido no computador e eu numa televisão - ou vice-versa - e minha filha na outra. E todos sozinhos. E há comida - congelada - para vários gostos e horários porque a gente esquenta na última hora, quando sobra tempo, no microondas. Então cada prato vai ao estilo do freguês, de acordo com o que houver na geladeira e, ah, é refrigerante para beber ou, no máximo, suco de polpa da fruta, que é menos difícil. Limão é azedo e gasta-se tempo para fazer seu suco.

Onde foi que estive da última vez que coisas simples e com disciplina me faziam mais alegre e segura ? Até quando vou negar isso para minha filha ? Negar essa educação tão necessária e tão simples, com horário certo para dormir, "0u come o que tem no prato ou não come nada", coisas assim? Porque dou-lhe a negligência educacional como troco pela minha ausência em casa causada pelo excesso de trabalho em busca do pote de ouro no fim do arco-íris ? E a gente tá careca de saber que, no final, era só cereal... Que momento parei, meu Deus, para falar sobre os dez mandamentos com ela? Eu não me lembro. Não houve esse momento. Não houve tempo porque eu estava fazendo o quê mesmo? Ah, correndo atrás do tal pote de ouro.


Sabe de uma coisa, minha gente? Ultimamente tem me dado uma vontade estranha de parar. Parar de correr atrás de nem sei o quê para enfim viver. Parar-tudo-agora-e-respirar. Respirar profundamente como se numa ioga com 24 horas de duração. Olhar para a lua, por tempo in-de-ter-mi-na-do. Acampar e sentir a brisa batendo no meu rosto em algum lugar de frente para um riacho. Ver minha filha colhendo flores do campo, brincar de bem-me-quer com ela e ter tempo de ensinar-lhe a respeitar a natureza e levar bem a sério alguns códigos morais, a maioria deles extraídos da Bíblia que leio assim, esporadicamente. Ter um pomar e fazer sucos de frutas fresquinhas, experimentando novos sabores. Aprender a fazer uma colcha de retalhos e ter paciência para isso. Andar descalça, plantar um pé de laranja-lima, procurar joaninhas, fazer bolo de fubá e servir com cafezinho, dormir na grama em dia de sombra, beber muita água e todos , absolutamente todos esses clichês. Todos mesmo, inclusive o indefectível “assistir ao pôr do sol sentada na varanda”. É que a vida anda mais citadina do que eu queria. Muito trânsito, muito relógio, muita agenda, muitas janelas com grades. E nada. Nada, nada, nada de viver a vida.

Oh, traga-me um chocolate quente ! Encomende um dia frio, um livro, e me traga um cobertor para partilharmos e umas conversas bem interessantes dos nossos antepassados ! Ou um dia de sol com rede, mangueira pra jogar água na meninada, gelatinas de muitas cores e um suco de limão estupidamente azedo e gelado. Traga-me, sobretudo, um abraço apertado e demorado, sem horário marcado, e traga-me calma. Pois estou em apuros nesta cidade, no oitavo andar de um apartamento cheio de tecnologia mas inapto à uma plantação de capim-cidreira !